A burocracia e os
grupos sociais.
Helton Hissao Noguti.
Gestão de Políticas Públicas
Escola de Artes, Ciências e Humanidades da
Universidade de São Paulo.
Max Weber e sua teoria da administração
clássica baseavam-se na premissa de que toda organização que se pautava em
regulamentos eram organizações formais. Portanto, burocráticas, estas, compostas
por regras, as quais prezavam por formalidade,
impessoalidade
e profissionalismo, todas buscando pelo equilíbrio de uma organização e a priori, manifestam-se mecanicistas, ao
passo que o lado subjetivo ficava aquém do burocrático.
Tratando-se
de grupos sociais, Weber não os considerava uma organização, separando-os em
dois grandes grupos: os grupos sociais primários, que se diziam grupos
informais (família, vizinhos e amigos), nos quais predominavam relações
pessoais; e os secundários, que eram grupos formais, onde as relações eram
regidas por regulamentos explícitos, como, por exemplo, o Estado.
Nos últimos anos, tem-se visto, com certa
frequência, grupos sociais secundários lutarem por direitos, que lhes são
negados pelo Estado, já que, este, simplesmente não reconhece esses grupos como
uma organização de pessoas que buscam ter direitos de reconhecimento, com a finalidade
de viver plena cidadania.
Posto
que, a sociedade cresce com padrões pré-estabelecidos, os quais são impostos
desde o momento da gestação, logo quando se descobre o sexo da criança, e sendo
menino, já é imposto que vestirá azul, terá um carro com 18 anos e irá gostar
de futebol. Por outro lado, quando é menina, vestirá rosa, dançará ballet e
terá festa de debutante aos 15 anos.
Deve-se
destacar que, o que esses pais, naquele momento de euforia, não compreendem é
que esse menino, por vários fatores, pode decidir não gostar de futebol, querer
dançar ballet, gostar de rosa, que essa menina, possa vir a ser uma jogadora de
futebol, goste de azul e de se vestir, como os padrões classificam, “como um
menino”. Diante disso, pergunta-se: Quais são as garantias de que essas
crianças têm de que serão aceitos por quebrarem padrões sociais
pré-estabelecidos pura e simplesmente por não serem assim?
A Constituição Cidadã diz claramente em seu
art 5º:
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade(...)”
Porém, para que se atinja essa igualdade, é necessário partir do pressuposto de que as pessoas são diferentes, e a burocracia se encaixa perfeitamente em reconhecer as desigualdades para que um dia se possa atingir a igualdade. Para explicar de que forma tal fenômeno ocorre, recorro à teoria de Nancy Fraser, baseada no Reconhecimento.
A Teoria do Reconhecimento surgiu nos EUA no
final da década de 1980, quando Marx estava em alta na Europa e Rawls na
América do Norte. Sendo que, ambos convergiam na ideia de que igual
redistribuição de bens poderia acabar com qualquer desigualdade social, visto
que era considerado fator da desigualdade econômica. Enquanto que, outros
teóricos encontravam a resposta no reconhecimento da dignidade humana, pois,
não era possível atingir a igualdade caso as diferenças (em particular) fossem
reconhecidas. Tal teoria ganhou notoriedade, o que ocasionou uma transição de
redistribuição para reconhecimento.
Quando
há a consciência de que a distribuição igualitária de bens materiais não será
suficiente para acabar com as desigualdades sociais, sendo, portanto,
necessário, aliá-lo ao reconhecimento da dignidade humana, a seguinte pergunta
surge: Como atingir esse reconhecimento?
Nancy
Fraser propõe a paridade participativa,
que nada mais é do que igualdade de condições para que as pessoas possam, um
dia, alcançar o mesmo patamar. Veja-se, por exemplo, as políticas afirmativas
presentes na Constituição, considerada como a carta maior de um Estado. Ora,
como já exposto, há a expressa disposição do artigo referente ao direito à
igualdade. Logo, a paridade participativa
é ferramenta que deve ser usada, inclusive pelos grupos sociais, para que eles
tenham possibilidade de exercer direitos que lhes são negados.
E
isso, pode ser feito com uma pergunta cuja resposta todos sabem, mas, a
burocracia, que não reconhece os grupos sociais como organizações e preza pela
impessoalidade, não consegue enxergar as necessidades que esses grupos sociais tem
a fim de que possam ter voz e viver a plena cidadania, direito inerente à essas
categorias.
Hoje,
no Brasil, burocracia é sinônimo de dificuldade, de afirmação e constante
mantenedora do status quo, fazendo
com que as pessoas obedeçam o que está disposto, caso contrário não conseguirão
objetivar seu direito. Como diz o próprio Max Weber:
“A dominação não
está em quem manda, mas sim em quem obedece.”
Sendo
os grupos sociais aqueles que se desvincularam daqueles padrões
pré-estabelecidos e ergueram-se contra o status
quo, para que lhes fosse garantida a paridade
participativa, deve-se considerar que não são os culpados pela sua
manutenção, e sim, vítimas, de uma “antipolítica” do reconhecimento, baseada no
simples preconceito. Esta, quando manifestada chega a ser anticonstitucional,
uma vez que liberdade de expressão não diz respeito à livre expressão do
discurso do ódio.
À
guisa de conclusão, tais grupos sociais devem ter seus direitos garantidos e
devem ter paridade participativa, considerando
que as teorias da administração evoluíram e passaram a enxergar as relações
sociais como algo importante, tanto para o crescimento do sistema, como a fim
de torna-las a favor de seu próprio status.
Referências Bibliográficas:
WEBER, Max. Teoria da Burocracia (1864-1920)
LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho:ensaios sobre sexualidade e
a teoria Queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
FRASER, Nancy. Reconhecimento sem
Ética. Theory, Culture & Society, v. 18, p. 21-42, 2001. Tradução de
Ana Carolina Freitas Lima Ogando e Mariana Prandini Fraga
Assis.