sábado, 21 de abril de 2012

A burocracia e os grupos sociais - Helton Hissao Noguti.


A burocracia e os grupos sociais.
Helton Hissao Noguti.
Gestão de Políticas Públicas
Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo.

   Max Weber e sua teoria da administração clássica baseavam-se na premissa de que toda organização que se pautava em regulamentos eram organizações formais. Portanto, burocráticas, estas, compostas por regras, as quais prezavam por formalidade[1], impessoalidade[2] e profissionalismo, todas buscando pelo equilíbrio de uma organização e a priori, manifestam-se mecanicistas, ao passo que o lado subjetivo ficava aquém do burocrático.
Tratando-se de grupos sociais, Weber não os considerava uma organização, separando-os em dois grandes grupos: os grupos sociais primários, que se diziam grupos informais (família, vizinhos e amigos), nos quais predominavam relações pessoais; e os secundários, que eram grupos formais, onde as relações eram regidas por regulamentos explícitos, como, por exemplo, o Estado. 
   Nos últimos anos, tem-se visto, com certa frequência, grupos sociais secundários lutarem por direitos, que lhes são negados pelo Estado, já que, este, simplesmente não reconhece esses grupos como uma organização de pessoas que buscam ter direitos de reconhecimento, com a finalidade de viver plena cidadania.
Posto que, a sociedade cresce com padrões pré-estabelecidos, os quais são impostos desde o momento da gestação, logo quando se descobre o sexo da criança, e sendo menino, já é imposto que vestirá azul, terá um carro com 18 anos e irá gostar de futebol. Por outro lado, quando é menina, vestirá rosa, dançará ballet e terá festa de debutante aos 15 anos.
Deve-se destacar que, o que esses pais, naquele momento de euforia, não compreendem é que esse menino, por vários fatores, pode decidir não gostar de futebol, querer dançar ballet, gostar de rosa, que essa menina, possa vir a ser uma jogadora de futebol, goste de azul e de se vestir, como os padrões classificam, “como um menino”. Diante disso, pergunta-se: Quais são as garantias de que essas crianças têm de que serão aceitos por quebrarem padrões sociais pré-estabelecidos pura e simplesmente por não serem assim?
   A Constituição Cidadã diz claramente em seu art 5º:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade(...)”
Porém, para que se atinja essa igualdade, é necessário partir do pressuposto de que as pessoas são diferentes, e a burocracia se encaixa perfeitamente em reconhecer as desigualdades para que um dia se possa atingir a igualdade. Para explicar de que forma tal fenômeno ocorre, recorro à teoria de Nancy Fraser, baseada no Reconhecimento.
   A Teoria do Reconhecimento surgiu nos EUA no final da década de 1980, quando Marx estava em alta na Europa e Rawls na América do Norte. Sendo que, ambos convergiam na ideia de que igual redistribuição de bens poderia acabar com qualquer desigualdade social, visto que era considerado fator da desigualdade econômica. Enquanto que, outros teóricos encontravam a resposta no reconhecimento da dignidade humana, pois, não era possível atingir a igualdade caso as diferenças (em particular) fossem reconhecidas. Tal teoria ganhou notoriedade, o que ocasionou uma transição de redistribuição para reconhecimento.
Quando há a consciência de que a distribuição igualitária de bens materiais não será suficiente para acabar com as desigualdades sociais, sendo, portanto, necessário, aliá-lo ao reconhecimento da dignidade humana, a seguinte pergunta surge: Como atingir esse reconhecimento?
Nancy Fraser propõe a paridade participativa, que nada mais é do que igualdade de condições para que as pessoas possam, um dia, alcançar o mesmo patamar. Veja-se, por exemplo, as políticas afirmativas presentes na Constituição, considerada como a carta maior de um Estado. Ora, como já exposto, há a expressa disposição do artigo referente ao direito à igualdade. Logo, a paridade participativa é ferramenta que deve ser usada, inclusive pelos grupos sociais, para que eles tenham possibilidade de exercer direitos que lhes são negados.
E isso, pode ser feito com uma pergunta cuja resposta todos sabem, mas, a burocracia, que não reconhece os grupos sociais como organizações e preza pela impessoalidade, não consegue enxergar as necessidades que esses grupos sociais tem a fim de que possam ter voz e viver a plena cidadania, direito inerente à essas categorias.
Hoje, no Brasil, burocracia é sinônimo de dificuldade, de afirmação e constante mantenedora do status quo, fazendo com que as pessoas obedeçam o que está disposto, caso contrário não conseguirão objetivar seu direito. Como diz o próprio Max Weber:

“A dominação não está em quem manda, mas sim em quem obedece.”

Sendo os grupos sociais aqueles que se desvincularam daqueles padrões pré-estabelecidos e ergueram-se contra o status quo, para que lhes fosse garantida a paridade participativa, deve-se considerar que não são os culpados pela sua manutenção, e sim, vítimas, de uma “antipolítica” do reconhecimento, baseada no simples preconceito. Esta, quando manifestada chega a ser anticonstitucional, uma vez que liberdade de expressão não diz respeito à livre expressão do discurso do ódio.
À guisa de conclusão, tais grupos sociais devem ter seus direitos garantidos e devem ter paridade participativa, considerando que as teorias da administração evoluíram e passaram a enxergar as relações sociais como algo importante, tanto para o crescimento do sistema, como a fim de torna-las a favor de seu próprio status.



Referências Bibliográficas:

WEBER, Max. Teoria da Burocracia (1864-1920)
LOURO, Guacira Lopes.  Um corpo estranho:ensaios sobre sexualidade e a teoria Queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
FRASER, Nancy. Reconhecimento sem Ética. Theory, Culture & Society, v. 18, p. 21-42, 2001. Tradução de Ana Carolina Freitas Lima Ogando e Mariana Prandini Fraga
Assis.



[1] As burocracias são essencialmente sistemas de normas, a figura da autoridade é definida por lei, que tem por objetivo a racionalidade da decisão baseada em critérios impessoais.
[2] As relações entre as pessoas são governadas pelos cargos que elas ocupam